O que faço com esta atração pelo mesmo sexo?
Do mesmo modo que é falso afirmar que uma pessoa tem total controlo sobre a sua orientação sexual, é igualmente falso afirmar que uma pessoa não tem qualquer controlo sobre o comportamento que decorre dessa orientação. Embora um indivíduo com atração pelo mesmo sexo não seja responsabilizável pela mesma, ele é, em qualquer caso, responsável pelas eventuais ações que dela decorram.
Daqui se conclui que uma pessoa com atração pelo mesmo sexo não é forçosamente compelida a agir de acordo com essa tendência e, em particular, a envolver-se num relacionamento afetivo e/ou sexual com alguém do mesmo sexo, nomeadamente se considerar que esse relacionamento pode suscitar-lhe problemas de ordem moral ou outra. Pelo contrário, essa pessoa, não obstante essa sua inclinação involuntária, mantem sempre a possibilidade de escolher livremente fazer outra opção de vida.
- Uma vez que a atração pelo mesmo sexo é normalmente um sinal de feridas emocionais não resolvidas, o primeiro passo será procurar compreender, para posteriormente enfrentar, as causas que estiveram na génese dessa atração durante o desenvolvimento da personalidade, de modo a poder experimentar a identificação total com o próprio sexo, na relação com os outros e, no caso de se ser crente, com Deus.
O crente deverá ter a consciência de que, mais do que tudo, só na pessoa de Jesus Cristo tem a resposta, a força, a motivação e as graças necessárias para arriscar e chegar ao tão desejado porto de destino. Ou seja, conhecer verdadeiramente o plano de amor único e irrepetível que Deus tem pensado para a sua vida, desde o início dos tempos, acaba por ser a sua grande mais-valia.
Em todo o caso, qualquer processo que se inicie é dividido em etapas e munido de técnicas e ferramentas que ajudam a concretizar os objetivos traçados. No que respeita à cura de feridas de índole afetiva/emocional, também há técnicas e ferramentas adequadas. Alguns aspetos importantes desse processo são os seguintes:
- Reconhecer que se tem uma questão por resolver. Essa questão pode estar relacionada com dificuldades na identificação com pessoas do mesmo sexo e/ou de relacionamento com pessoas do outro sexo, decorrentes nomeadamente de necessidades afetivas não satisfeitas, bem como de feridas emocionais associadas à relação com progenitores, irmãos ou colegas.
- Querer resolver essa questão. Nunca é tarde para o fazer e existem muitos testemunhos que o comprovam. Para ajudar neste processo são necessárias, nomeadamente, motivações válidas e fortes, bem como boa companhia.
- Pedir ajuda. A um técnico especializado, um amigo, um grupo, um diretor espiritual. Muitos poderão ser os canais para o início de um novo itinerário de vida. Comunicar os pensamentos tóxicos a um terapeuta, amigo ou grupo pode ajudar a convertê-los em pensamentos simples, que facilitem a identificação de sentimentos e necessidades.
- Modificar comportamentos. Isto implica identificar e eliminar todas as dependências de índole sexual ou outra (por exemplo, pornografia, masturbação, álcool, drogas, compras e comida compulsivas, videojogos), bem como todas as fontes de influência que possam alimentar a atração indesejada pelo mesmo sexo, incluindo atividades e/ou relações não saudáveis.
- Construir um grupo de relações saudáveis, reparadoras e não erotizadas com pessoas do mesmo sexo. Só este tipo de relações é adequado a dar cumprimento às necessidades mais profundas da pessoa, neste percurso. Estas relações vão substituindo, pouco a pouco, os comportamentos e fantasias sexuais, permitindo experimentar o afeto que pode ter faltado no passado. Podem fazer parte desta rede de apoio, por exemplo, a própria família, amigos, o cônjuge, a comunidade espiritual e grupos de apoio, presencial ou telefónico.
- Favorecer a auto-estima. Descobrir novos talentos e atividades que possibilitem a valorização pessoal e o serviço aos outros. É muito importante sair da bolha da autocomiseração. A prática desportiva é crucial neste processo, pois possibilita curar feridas relacionadas, por exemplo, com a imagem corporal rejeitada no passado, a exclusão de grupos ou a falta de coordenação psicomotora. Ao mesmo tempo possibilita o aumento da sociabilização com os outros, em particular com elementos do próprio sexo, a identificação com os pares num contexto de equipa e a superação de desafios relacionados com medos comuns, como o de enfrentar a nudez num vestiário ou balneário.
- Experimentar o valor extraordinário da relação com Deus. Uma vez livre de todas as adições sexuais ou não sexuais do passado, começa-se a experimentar uma liberdade interior e uma união com Deus nunca antes vivida, que é potenciada pela prática regular da oração e da vivência dos sacramentos. Foi a falta de amor que nos feriu; é através do amor que experimentamos, de Deus e dos outros, que nos curamos.
Em suma, e parafraseando o psicólogo Richard Cohen, quando se aprende a aumentar a sua autoestima, experimentando o seu próprio valor dentro da sua relação de amorcom Deus, curando as feridas do passado e suprindo as necessidades de amor que permaneciam insatisfeitas, poder-se-á readquirir a plenitude da vivência do seu desígnio original.
Enquanto alguns psicólogos e psiquiatras consideram não ser de todo, ou só muito raramente, possível uma mudança da orientação sexual, outros psicólogos e psiquiatras defendem que é possível a superação da atração pelo mesmo sexo, havendo inclusivamente muitas evidências empíricas que o comprovam. A incompreensão das verdadeiras causas da atração pelo mesmo sexo leva muitos terapeutas a aconselharem os seus pacientes a aceitar que nasceram “homossexuais” e a adotar um estilo de vida “homossexual”. Contudo, são muitos os especialistas que testemunharam a resolução dos conflitos internos que causaram a atração pelo mesmo sexo de muitos homens e mulheres.
Peritos como Robert Spitzer, um dos psiquiatras responsáveis pela retirada da atração pelo mesmo sexo do manual diagnóstico e estatístico de desordens mentais (DSM), admitiram, entretanto, os seus equívocos e são hoje especialistas em terapias de reorientação de pessoas com atração indesejada pelo mesmo sexo.
Com base na investigação que levou a cabo, Spitzer defende que é possível a evolução de uma atração pelo mesmo sexo para uma atração pelo sexo oposto e que não há evidências que sustentem a alegação de que uma terapia de reorientação pode ser prejudicial.
Uma vez que não é uma doença, mas um sinal de uma perturbação afetiva ou emocional, não faz sentido falar-se de cura da atração pelo mesmo sexo. O que é objeto de cura são as feridas emocionais que podem estar na base dessa atração, que constituem respostas inconscientes e desordenadas a conflitos internos não resolvidos. Muitos terapeutas não contribuem para a cura dessas feridas emocionais porque não identificam cabalmente as causas das mesmas nem incorporam na sua terapia para pessoas com atração pelo mesmo sexo elementos como o perdão, com vista à resolução da raiva e da superação da tristeza, da desconfiança, da baixa autoestima e de comportamentos aditivos dessas pessoas.
Falar de cura da atração pelo mesmo sexo é, pois, não apenas desadequado, mas também eventualmente ofensivo para pessoas que sentem essa atração. Qualquer tentativa de mudar a orientação sexual destas pessoas poderá ser mal interpretada, como se significasse que elas são mais problemáticas do que pessoas que sentem atração pelo sexo oposto ou que só as pessoas com atração pelo mesmo sexo têm feridas emocionais e questões psicológicas por resolver. Embora a alteração da orientação sexual seja possível, ela deve ser apenas um efeito potencial e nunca um objetivo primário do processo terapêutico. O enfoque deste processo não deve estar na mudança dos sentimentos da pessoa, mas na sua integridade emocional e, no caso de ser crente, também espiritual.
Por mais intenso que seja, nenhum afeto obtido na idade adulta pode compensar aquele que não foi recebido de progenitores, irmãos e colegas na infância ou na adolescência. Compreensivelmente, muitos homens e mulheres preferem acreditar que são irreversivelmente homossexuais em vez de encarar os seus conflitos interiores, resistindo a reconhecer as suas feridas emocionais por medo da dor que lhes está associada ou porque estão influenciados pela cultura atual, segundo a qual não há conflitos psicológicos relacionados com a atração pelo mesmo sexo.
Quem recorre à terapia devido a uma atração indesejada pelo mesmo sexo, nem sempre é desafiado a resolver os seus sentimentos hostis relativamente aos seus progenitores e colegas, nomeadamente através do perdão e da cura de ressentimentos. Nem sempre é confrontado com os desejos mais profundos e constitutivos do seu coração, sendo muitas vezes, pelo contrário, encorajado a adotar um estilo de vida que lhe dê mais facilmente prazer e bem-estar em vez de aprofundar o que verdadeiramente gostaria que fosse a sua vida e qual o significado existencial da atração pelo mesmo sexo. De igual modo, nem sempre será encorajado à reconstrução de uma autoimagem positiva de si próprio enquanto homem ou mulher, que passa também pela aceitação do significado do seu corpo enquanto realidade dada. Por exemplo, certos traumas emocionais não estão a ser identificados em muitos homens devido à incapacidade dos terapeutas de reconhecer a poderosa influência da (in)aptidão para o desporto, bem como da relação com o pai, sobre a identidade masculina.
Muitas vezes também se verifica na pessoa com atração pelo mesmo sexo uma tendência para as artes. Um dom para a música ou para o canto, para a dança ou para a pintura, pode ser uma variável que dificulta a integração entre os pares do mesmo sexo. Em conjunto com os outros fatores já mencionados, esta forma de ser diferente e de se sentir diferente pode tornar-se um elemento decisivo na escolha dos companheiros com quem essa pessoa se sente mais identificada.
É comum qualificar de “homossexual” uma pessoa que sente uma atração por pessoas do mesmo sexo. Contudo, essa atração ou os atos sexuais que dela possam decorrer não constituem, por si só, condições estruturais de uma pessoa, pelo que não é correto definir alguém apenas com base numa tendência sua ou num comportamento suscitado por essa tendência, como se estas fossem as características principais dessa pessoa.
Assim, em vez de qualificarmos alguém como “homossexual”, é preferível referirmo-nos a uma “pessoa com atração pelo mesmo sexo” ou, no limite, utilizarmos a palavra “homossexual” como adjetivo e não como substantivo, como, por exemplo, na expressão “pessoas homossexuais”. O mesmo é válido para a expressão “heterossexual”, bem como para a divisão da humanidade entre “heterossexuais” e “homossexuais”, algo que deve ser evitado, uma vez que existem apenas duas identidades sexuais propriamente ditas – homem e mulher – determinadas pelo sexo com que se nasce.
A expressão “sair do armário” é normalmente utilizada para descrever uma situação em que uma pessoa – regra geral, com atração pelo mesmo sexo –anuncia a sua “identidade sexual”. A pessoa que se autoidentifica como “homossexual”, “gay”, “lésbica” ou “bissexual” baseia a sua identidade na respetiva orientação sexual ou no comportamento que dela decorre. Porém, essa “etiqueta” social, apesar de autoatribuída, não é adequada, uma vez que é redutora qualquer identidade baseada na respetiva orientação sexual ou na prática de atos por ela suscitados.
Apesar de muitas vezes encorajado, esse “sair do armário” (ou coming out, na expressão em inglês) é particularmente desadequado em pessoas mais jovens, cujo processo de desenvolvimento psicosexual ainda se encontra em curso e no âmbito do qual é comum existirem relacionamentos afetivos e sexuais entre pares, sem que tal signifique uma inclinação predominante ou exclusiva relativamente a pessoas do mesmo sexo. E, ainda que possa parecer libertador, um coming out pode, na verdade, ser limitador, ao determinar a orientação sexual como o elemento mais decisivo da vida da pessoa e contribuir, assim, para reforçar o distanciamento relativamente aos seus pares, o qual, em muitos casos, está na origem da atração pelo mesmo sexo.
Em todo o caso, e ainda que seja recomendável a prudência neste âmbito, poderá revelar-se vantajoso para uma pessoa com atração pelo mesmo sexo assumir essa atração perante alguém da sua confiança (por exemplo, um familiar, um amigo, um terapeuta, um diretor espiritual ou um membro de um grupo de autoajuda), na medida em que tal abertura poderá ajudá-la a quebrar o seu eventual isolamento, bem como garantir-lhe o apoio e o encorajamento para abordar essa condição e procurar entender as causas que lhe possam ter dado origem.